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3 anos 1 mês

O resgate da água ou o beijo da serpente

O partido socialista surpreendeu a assembleia municipal quando na última sessão iniciou os trabalhos com uma proposta amistosa ao PSD tendo em vista a criação de um grupo de trabalho que permitisse à CMPF preparar em consenso o resgate da gestão das águas à empresa titular da concessão.

Uma proposta depois de notícias que assinalavam o “escândalo” existente no concelho de os consumidores comerciais serem obrigados a desperdiçar água para diminuir o custo do consumo (!) e na sequência de declarações do presidente “revoltado” com o “fundo abutre” que hoje gere a concessão.

Surpresa ainda maior quando a propósito da sessão anterior da assembleia, o líder da bancada emitiu um comunicado onde  referia existir (“Esta) evidência (que) expõe, perante os olhos da nossa comunidade, a  incapacidade de Alexandre Costa de assumir compromissos públicos.”

Convenhamos que entre Janeiro – data do comunicado – e Fevereiro – data do pedido de conciliação de interesses – passou pouco tempo; isto se dermos valor às declarações do líder da bancada socialista nas duas sessões da assembleia municipal.

É certo que em política a noção do tempo é relativa ao interesse imediato, mas a responsabilidade das declarações fica sempre do lado de quem as proferiu. E neste caso o convite feito precisa de ser esclarecido tendo em conta a importância que teria para o concelho uma abordagem consensual entre os dois partidos que desde o 25 de Abril gerem o município.

Tendo em conta a experiência de outros municípios que iniciaram já o processo do resgate, convém verificar – até para não iludir os eleitores – que, neste momento, o município não está em condições de pedir o resgate uma vez que ainda não saiu do FAM, embora tenha feito o pedido.

A primeira condição (substancial) para iniciar o processo do resgate é ter condições legais que permitam garantir o financiamento do possível resgate. O município e o FAM terão assim de formalizar a saída do “endividamento excessivo” que – recordemos – era esperado para Março de 2022, no momento em que a CMPF anunciou ” a saída do FAM” (Dezembro 2021).

A segunda condição (material) é definir o valor do resgate. A avaliar pelos cálculos feitos por assessoria do município aquando do memorando de 2017, onde se encontram algumas apreensões decorrentes das fragilidades de análise económica e financeira, este trabalho não está concluído de forma satisfatória para obter o parecer favorável do Tribunal de Contas.

A terceira condição (legal) prende-se com a justificação que o município terá de apresentar para sustentar que o resgate deve ser feito, tendo em vista o “interesse público”.

A quarta condição (financeira) – depois de definir a segunda condição que pressupõe a primeira – é obter do Tribunal de Contas aprovação para obter financiamento para garantir a liquidação do contrato e assumir a gestão da concessão.

Estes passos são árduos. Exigem muito trabalho – que acreditamos está a ser feito – mas sobretudo serenidade institucional de modo que a este processo sejam chamados os melhores técnicos, dedicados a resolver os problemas em causa. Dos políticos “profissionais” deveríamos receber alguma contenção.

Também se mostra essencial reflectir sobre os pareceres da ERSAR. Uma leitura atenta do que esta autoridade produziu acerca deste assunto quanto ao nosso concelho e a outros que pretendem também o resgate, permite encontrar a base hermenêutica do possível acordo jurídico que é preciso elaborar.

Desconsiderar o parecer da ERSAR por não ser vinculativo é um erro estrondoso e precipitado pois sendo de facto consultivo, o entendimento desta autoridade sobre os processo em causa é tido em conta no momento da decisão do Tribunal de Contas quando este é chamado a autorizar o investimento ou endividamento/empréstimo pelo proponente do resgate.

Basta ler as decisões do Tribunal de Contas sobre outras concessões e poderá o leitor verificar que o acima escrito é peça fundamental.

Neste contexto, precisam os eleitores e consumidores do concelho de serem informados, pelo poder legítimo, sobre a fundamentação do pedido de resgaste, dispensando-se declarações de circunstância que servindo para entreter e fabricar títulos de jornais, nada adiantam.

Na próxima assembleia municipal se verá se o PSD responde positivamente ao pedido do PS ou se dispensa esta “dança” por não gostar da música do baile que lhe está oferecida.