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Os liberais pacenses e os espanhóis de Freamunde

A terra onde vivemos sempre foi espaço de disputa territorial e sofreu mudanças administrativas de natureza política e religiosa. Tensões entre as dioceses de Braga e do Porto, opções entre apoiantes do rei D. João IV e os fiéis aos Filipes (reis de Espanha) experimentaram-se aqui, numa contenda que deixou marcas (embora hoje quase esquecidas e sem efeito prático).

Na “guerra da Prestação” (1640-1668), havia apoiantes de D. João IV e outros apoiavam os Nobres fiéis ao Filipes (reis de Espanha). Os conflitos duraram bastantes anos e os apoiantes de Castela viram os seus bens serem afetados aos vencedores nacionalistas, que passaram para a Casa do Infantado (como o caso da Honra de Sobrosa) ou para os nobres nacionalistas (caso da Comenda de Sanfins de Ferreira).

Consequência destes alinhamentos restam as referências a “espanhóis” com que gentes do sul do concelho alcunham as de Freamunde. E talvez fundamentem a reacção de Gil Aires na “Gazeta de Paços de Ferreira” em 1955:

« (…) Já lá vai uma abonada década que pertenço aos arraiais de Freamunde. E, francamente, (por que não dizê-lo abertamente?), vive Freamunde numa total postergação que confranje, que esmaga a alma. Nada vi, durante este lapso, que representasse produto da acção camarária, mas sim desleixo, incúria, abandono, e, tal estado de coisas, nem por sonhos quero eu atribuí-lo à inépcia, ou, em expressão corrente, má fé dos seus servidores. Seria injusto e talvez desumano pensar assim. Freamunde é uma Vila que tem reais condições para poder mostrar aos outros o seu progresso, para “vestir-se”, ao menos, já que o seu erário terá de ser repartido em benefício de outras freguesias. E que vemos nós? Promessas de execução de um plano sebastianista de urbanização e quejandos que andam à roda disto. A sua iluminação, quer pública quer privada, é das piores que há em Portugal. Saneamento não existe. Água, há a que se pede por favor a qualquer proprietário; em arruamentos será talvez melhor não falar por desolador que é este assunto.
Que temos, então, além dum montão de pedras, dignas das ruínas de Pompeia, semelhando reles pavimentos? Nada. Vastíssimo será o campo que se abrirá aos olhos de V.Exª se nos der a honra duma visita. E Freamunde saberá receber V.Exª e saberá pagar no dia em que a dinâmica mão de V.Exª lhes apague a sede de justiça, bem flagrante, por sinal». “In” Gazeta de Paços de Ferreira.

Até ao liberalismo estes territórios do atual concelho de Paços de Ferreira, integravam: Honra de Sobrosa, o couto de S. Pedro de Ferreira, a Honra e a Comenda de Frazão; a Comenda de S. Pedro Fins de Ferreira, a Comenda de Penamaior , a Casa do Infantado, a Honra de Paços de Ferreira.

Com a reforma administrativa de 1836, com a diferença de uma ou outra freguesia, o concelho de Paços de Ferreira foi a única unidade administrativa que sobreviveu.

A 6 de novembro de 1836, afirma-se a vitória dos liberais pacenses e dissolvem-se os poderes dos nobres conservadores (Sobrosa e Frazão) e da Igreja (S. Pedro de Ferreira e S. Pedro Fins de Ferreira).

Os conflitos deixaram as suas marcas e, neste contexto, Freamunde que pertencera à Casa do Infantado/Honra (Sobrosa) e Couto (Ferreira), mesmo sendo a freguesia mais desenvolvida e com maior vitalidade desta região, foi preterida.

O atual concelho de Paços de Ferreira corresponde à bacia hidrográfica das nascentes do rio Ferreira e integra os extintos concelhos de Frazão e de Ferreira, algumas freguesias do extinto concelho de Sobrosa e uma freguesia (Penamaior) que, até 1855, pertencia ao extinto concelho de Negrelos. Paços de Ferreira deixou, por breves tempos, de ser concelho e os seus territórios chegaram a estar distribuídos por Paredes e por Barrosas.

A unidade administrativa deste território nunca foi pacífica. A vitória dos Liberais impuseram Paços de Ferreira como a única sede concelhia mas as vontades das gentes nem sempre se vergam aos Decretos. Ainda em 1998, o desejo de Freamunde se assumir como sede de concelho, com as antigas freguesias da Terra de Ferreira (Raimonda, Figueiró, Codessos, Lamoso e Sanfins de Ferreira) voltou a afirmar-se e fez chegar a sua proposta a votação na Assembleia da República, como se pode ver em publicação, 5 de março, no Diário da República.


Nota: foto de Gil Aires, in Blog Freamundense – http://freamundense.blogspot.com/2016/06/gil-aires.html

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