Vivemos num mundo de contradições, de disparidades, de ameaças à integridade individual e coletiva, à serenidade necessária ao desenvolvimento, à paz de espírito e à paz no mundo.
É um mundo louco de atropelos , atitudes de vingança e assunção de medidas que geram o medo, o refúgio, a ausência de cada um dentro de si.
Se por um lado, somos impressionados por a invenção dum aparelho capaz de produzir oxigénio para a viagem espacial a Marte, também ouvimos, aterrados, a não aceitação de doentes Covid, por parte de alguns hospitais indianos, por falta desse elemento essencial à vida e por outro lado, a notícia terrífica do desaparecimento dos mais de meia centena de indonésios, no fim do mar escuro e enganador.
Morre-se, morre-se cada vez mais, por demora e falhas de vacinação, por desvalorização e incumprimento das regras, por descuido, enfim, pela ignorância miséria e a fome sejam elas de que etiologia forem, morais, materiais e mentais. A população mundial está a diminuir, no Brasil, por exemplo, o saldo fisiológico está a regredir e persiste a teimosia dos governantes perante a pandemia do nosso tempo.
Enquanto isto, em muitos polos do nosso planeta, pequenas/ grandes guerrilhas que matam, constrangem, traumatizam a existência dos menos preparados, dos abandonados ou mais frágeis. Às vezes, cá no nosso âmago, até antecipamos e tememos o advento duma terceira guerra mundial, dada a similitude de sinais das vésperas das duas grandes guerras e as do mundo contemporâneo, em que as malquerenças, entre alguns países, o acesso e invenção desigual de armas cada vez mais mortíferas, os nacionalismos exacerbados que conduzem ao domínio dos ricos sobre as economias que estiolam perante a exploração…
Há quem tente adivinhar o futuro e mesmo se, como e quando acontecerá o tão propalado fim do mundo. Mas este aproximar-se-á com o degelo das calotas e dos glaciares que obedece ao despotismo da industrialização e da tecnologia e emanação consequente de produtos que afetam, desflorestam, destroem habitats e a biodiversidade e intoxicam a vida e o ser. Ou por quem se “esquecer” e ligar o botão das armas arrasadoras.
Apetece-me, terminar esta reflexão, com alusão a José Saramago que no poema “Fala do Velho do Restelo ao astronauta” proclama “Aqui na Terra, a fome continua.”
Rosalina Oliveira, escritora de Freamunde